Sara-a-Dias surgiu num dia de chuva torrencial, em que mais uma vez Sara Osório, a sua autora, saía de casa sem guarda chuva. Ia acompanhada de um saco de papel que rapidamente se rasgou, deixando toda a comida que estava lá dentro, rolar chão abaixo. Acumulando a isto, aconteceram uma série de peripécias menos agradáveis nesse dia que inspiraram Sara! Pois é, Sara naquele dia teve uma epifania, não sabe se por reacção aos acontecimentos mais recentes, ou se por ter adoptado a sua cadela Maria há pouco tempo, Sara precisava de uma mudança na sua vida.

Sem meias medidas, criou a “Sara-a-Dias”, um pseudónimo ilustrativo de episódios da sua vida, se é que se pode chamar assim. Um tumblr, uma página de Facebook, e cerca de 3 anos depois, mal ela imaginava o impacto que ia gerar com as ilustrações da sua vida. Uma contadora e recriadora de histórias incrível, Sara Osório, mais conhecida por Sara-a-Dias lança agora a sua primeira novela gráfica A MINHA MÃE ACHA QUE FUI TROCADA Á NASCENÇA  no próximo dia 17 de março, na Livraria Alêtheia.

A magazine acompanha o seu trabalho desde há algum tempo e decidiu convidar a Sara para uma conversa informal,  afim de desvendar alguns segredos, medos e inspirações desta contadora de histórias gráficas.

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Desde muito nova, sempre se sentiu impelida a superar-se a si mesma e isso começou na escola.

“Sempre que a escola recomeçava, eu chorava porque sabia que ia haver testes e ia ter que estudar tanto.” A professora do terceiro e quarto ano sem saber foi razão de grande ansiedade para Sara, mas também constituiu uma das suas grandes inspirações  para o sentido de resiliência e esforço que acompanha Sara até hoje. “Por causa desta professora, pus a fasquia tão alta, que sempre ambicionei ser top of the top. Punha o meu gorro para me congelar as ideias e lá estudava para ter boas notas.”

Esta ambição sempre causou a Sara uma grande ansiedade e sentimento de responsabilidade. Pelo que perguntamo-nos onde vai a Sara buscar este sentido de humor tão apurado e uma destreza para olhar sempre para o lado luminoso da vida?

“Acho que sou uma criança, tenho uma mente muito jovial. Não levo a vida nada a sério, prefiro rir-me das coisas más. Quando acontece alguma coisa menos boa, desabafo até à exaustão com as pessoas que me são mais próximas, e depois passa-me.”

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Nos seus testes psicotécnicos, as três opções resultantes foram Educadora de Infância, Arquitecta ou Jornalista. Ora por exclusão de partes, o psicólogo “conselhereiro” acabou por sugerir à Sara que fosse para Jornalismo, e esta que sempre se considerou muito obediente, fez o que lhe propuseram. Ingressou em Ciências da Comunicação na Universidade Nova de Lisboa. Mas mal acabou o curso, cedo tirou as expectativas de poder vir a trabalhar “no que gostava”, como cinema por exemplo. Estagiou três meses como “assistente do assistente de produção” de uma curta (episódios que também aparecem na sua novela gráfica), fez de tudo e percebeu que precisava de arregaçar mangas à séria para poder vir a ser independente, e sair de casa dos pais aos 25 anos como desde cedo projectara.

Há 8 anos quando Sara saiu fresca e fofa da faculdade, não baixou braços, mas também não teve tempo para procurar um trabalho que a realizasse. Há 8 anos que Sara tem um trabalho de escritório, de atendimento ao público, das 9:00 às 18:00, mas nem por isso renunciou ao seu sonho.

“Ao final de 3 anos deste trabalho, em 2011 estava naquele estado de estagnação que precisava de um novo desafio. Fui tirar um curso pós-laboral de Design na Restart. Na altura, aquele curso agarrou-me imenso pela sua componente prática, porque eu não tinha tido isso. Quando tive o bloco com o Paulo Arraiano, redescobri a paixão pelo desenho. Tanto, que todos os trabalhos que me pediam, desde logos a imagem, eu resolvia-os com ilustrações. Chegou ao ponto de me dizerem: Sara que tal não fazeres só ilustração?”

Sara é uma artista que está devotamente desperta para a imagem e aspecto visual das coisas: “se um livro tiver uma boa capa, eu compro, senão me chamar minimamente pela imagem, eu nem olho para ele. Sou uma pessoa mais visual. Tenho tão pouco tempo que prefiro graphic novels ou bandas desenhadas.”

Na sequência do reacender desta chama pela ilustração, Sara começou a pôr a mão na massa, ou melhor a dar uso à caneta. Concorreu a vários concursos, desde as Sardinhas de Lisboa e muitos outros, mas sem grande impacto. Começou a esmorecer um pouco, mas todos os que conheciam bem Sara e o seu trabalho a incentivavam a fazer algo seu. Pensou em ilustrar os episódios que lhe iam acontecendo e publicar um livro. Mas o medo de ser uma autora nova e da recessão do mercado fizeram-na recuar.

“Voltei a um ponto em que não sabia o que fazer. Continuava no mesmo trabalho. Mas arranjei uma cadela, que era um dos meus objectivos de vida.”

Maria, cadela de Sara

Maria, cadela de Sara

“Num dia em que tudo me estava a correr mal, sai do trabalho almareada, a chover torrencialmente, sem chapéu de chuva, estava na paragem de autocarro a pingar literalmente e pensei: é isto, vou apontar isto para não me esquecer. E criei o blog. O nome Sara-a-Dias, veio ele também de um paradoxo: sempre detestei o Dias no meu nome, mas naquele dia sentia-me mesmo uma mulher a dias.”

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Durante toda a sua vida, Sara teve a brilhante ideia de ir apontado aqui e acoli, pedaços da sua vida. “Não tive diários, mas tive sim aquele ímpeto de ir apontando histórias minhas em cadernos soltos. Sempre tive esse hábito de contar muitas histórias.”

Contou as suas histórias e não só, começou a fazer encomendas personalizadas, ilustrou a capa de dois livros “A Puta Que Pariu o Amor” da Lady Mustache e “De Uma Mulher Para Mulheres Que Amam Demais” de Débora Àgua-Doce, fez vídeos ilustrados para o Público, entre muitos outros trabalhos. Sara-a-Dias tornou-se no seu segundo ofício em horário pós-laboral.

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Estas histórias ganharam uma visibilidade tal que saltam agora da web para um livro, que já está nas bancas e irá ser lançado oficialmente na próxima terça-feira, dia 17, às 18:30 na livraria Alêtheia, na Rua do Século.

Não perca a oportunidade de conhecer a obra desta jovem ilustradora e contadora de histórias nata, que o farão por certo sorrir, e encontrar o lado alegre da vida, como tão bem a própria autora o sabe fazer.

 “Tenho sempre as minhas expectativas super baixas. Só acreditei que o livro estava mesmo cá fora, quando o vi impresso.”

Podes acreditar Sara! A Magazine estará lá para o comprovar :)

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